25 de setembro de 2012

o jardim dos vocábulos.

um dia encontrou, no meio daquele jardim de palavras, uma de significado peculiar: CON.FI.AN.ÇA.
ficou tão impressionado com o cheiro que exalava aquele vocábulo, que resolveu se aprofundar no caminho e seguir a rota que levava aquele odor.
pode perceber que diversas eram as palavras que possuíam a mesma beleza estética, mas seu olfato era atraído especialmente por aquelas quatro sílabas.
toda vez que, captado pelos seus olhos que, egoístas, queriam trazer a atenção da razão só para si, ele se apaixonava perdidamente por uma palavra de apurada beleza, percebia que seu caminho não era pautado pela mesma segurança que o cheiro da confiança lhe proporcionava. sempre que seus olhos lhe mostravam maravilhas, a estrada que percorria era espinhosa, desnivelada, irregular.
mas veja que um dia resolver pautar a estrada da vida no cheiro da confiança. fechou sua visão e abandonou-se no olfato, certo de que a rota agora estava preparada, exalando cheiro de certezas.
percebeu que certo estava o tal Drummond ao dizer que no caminho tinha uma pedra. mas, em absoluto, nunca tropeçou numa delas e caiu despedaçado no chão.
se caiu, caiu pra tomar consciência da superfície linear que era o caminho que trilhava. caiu pra entender que o joelho sustenta, que ferida cicatriza, que tem gente ao lado, que tropeçar e cair é corriqueiro.
jamais se arrependeu de ter aposentado a retina.

15 de setembro de 2012

Positiva-idade.

Quem nunca esfregou a caneta atrás da cabeça, até que ela esquente, e tentou fazer grudar uns pedacinhos de papel picotado, antes repousados sobre a carteira?
A primeira vez que vi alguém tendo sucesso com essa experiencia, me senti trapaceado, como em qualquer show de mágica pitoresca que assisto. Que que eu não vi?
Eis que, tempos depois, meu professor de química desmistificou a mágica da caneta grudenta. De acordo com ele, ao atritar a caneta no cabelo, algo acontecia com as cargas elétricas que a transformava em um pseudo-imã que fazia atrair os papéizinhos. Algo que chamaram de eletrização por indução ou alguma coisa assim.
Crescido, agora eu reparo numa presença em especial que, assim como as canetas ionizadas, parece retirar qualquer íon negativo que, desapercebido, foi pairar na minha áurea sem que eu percebesse. É um tipo de vassoura eletronegativa que varre todos os resquícios de sentimentos ruins que pudessem estar me tomando.
É um sorriso. Uma palavra. Uma rima. Um samba. Um agradecimento.
Diante de todo aquela sensação de que o céu nos girava em seus braços, não pude compreender quando as palavras chegaram ao meu ouvido: "cada um de voces faz a diferença na minha vida". Não pude, porque parecia que o único beneficiado com a positividade ali era eu. Parecia até egoísta da minha parte querer tomar tudo que houvesse de bom ali para o meu bem-estar. Mas vieram essas palavras de carinho e, em seguida, aquele agradecimento, para mim descabido.
Olha, quisera eu poder colocar uma conclusão, um clímax na história, uma lição de moral. Mas meu poder de compreensão não consegue se fazer ouvir.
No momento, ele soa rouco, manso, ritmado num samba, servido de muita energia que não posso traduzir. A imagem que fica é só da coisa boa que essa figura traz. Uma alegria de estapear qualquer sagitariano bem vivido.
Que a felicidade seja nosso altar nessa noite.

11 de setembro de 2012

Escrevo para tentar entender.


Na vida, posso vislumbrar dois tipos de relacionamentos. E me refiro, neste instante, aos fraternais porque a preguiça me inunda e não me permite dizer acerca dos amores shakespereanos.

Existe um laço fraternal que acontece pra crescer. E crescer somente, até a estagnação. É quando dois positivos se encontram e, pasmos com a tamanha similaridade dos polos, passam a se acompanhar. Giram, eles, em torno do mesmo núcleo e não se estranham.

Este tipo de ligação, em particular, tende à mesmice. Sempre estagnada, não há altos, ou baixos, e os momentos memoráveis dessa relação estão balizados pela normalidade. Quase como um padrão, regular como um aluno nota 8,0.

Por outro lado, existe um tipo de laço afetivo que se reconstrói de um desabamento.

Sabe esses prédios que, por algum motivo, são destruídos e, acima de suas cinzas, se ergue um castelo dos mais ricos e cimentado pela quase perfeição?

Este tipo de fraternidade nasceu de uma afinidade, sem dúvida, mas de um positivo e um negativo. Dois pontos divergentes que, muitas vezes, não circundam o mesmo núcleo, objetivo, padrão de vida. Mas, como num monitor de 22 polegadas que tem um pixel morto e toda a atenção do usuário é chamada para aquele mínimo ponto, existe uma convergência para o que chamam amizade.

Divergentes que são, esses dois polos acabam se estranhando em determinado momento e verificam que não há força alguma que os faça atraírem-se e permanecerem de braços dados novamente. Se perde no caminho aquela afinidade primeira, superficial que era, como muitas que se atreveram escapar quando se passa do módulo colégio para o módulo universidade.

Tem-se a impressão que “melhor assim” e que a decepção, ou o sentimento ruim que brotou dali, vai tardar a cicatrizar. Por vezes, o receio de cutucar o machucado, ou mesmo um segundo golpe onde já estava sensível, leva à reflexão que o afastamento é o melhor remédio. “Não há que se fazer esforço por um laço de amizade”, a cabeça raciocina.

Mas veja que os polos se reencontram. E, ora por esforço de um, ora por laissez faire do outro, verifica-se um recomeço.

Aqui, cada ladrilho é colocado com demasiada cautela, e, por vezes, hesitação.

Não estou desmentindo a máxima que afirma que confiança perdida é como uma jarra de vidro que se quebra, cujos caquinhos juntos não formam um novo recipiente com a mesma solidez que o antigo. Até chego a concordar quando me dizem. Mas na ressurreição desse companheirismo, observa-se um bem-querer que transpõe tal verdade, e lança mão dos artifícios humanos traduzidos em desconfiança, traição, mero coleguismo, orgulho, preconceito.

Só é possível explicar como transcedentalidade, o que acontece. A amizade que surge de uma decepção, quando o bem-me-quer é sincero, ultrapassa os limites da regularidade, da amizade morna. Aqui, a conversa passa a ser outra.

Digo isso tudo porque alguns dos amigos que mais me importo, que mais quero eternos e que mais desejo proximidade, renasceram. Foram implodidos e re-estruturados na humildade, na consideração e na admiração pessoal.

Com o tempo, eu aprendi que o amor não nasceu pra ser guardado. Muito menos tão somente recebido. E essa constatação me fez colocar pontes de hidrogênio nas estruturas de meus relacionamentos.

A tendência que rege o amor ruma ao outro. Não haveria que se falar em amizade, fraternidade e companheirismo se não houvesse o pai-de-todos amor. E este não sobreviveria se não existisse a quem prestá-lo.

Hoje em dia, não guardo amor pra não sedimentar açúcar.

13 de agosto de 2012

A fábula por trás da cortina.


De todos os momentos da minha vida ainda pequena, pretendo descrever 30 segundos em que a respiração falha e o coração descompassa, tremendo.

É aquele instante após o abraço. A cortina se fecha, o palco escurece e o silêncio reina em cada movimento.

Posso sentir meu corpo vibrar de vontade. Transpira a dança pelos poros, aguardando o 8 correto para expandir, enquanto a platéia toma assento e sussurra os preconceitos que já pairam entre o leigo e o bem entendido.

Ali eu quis que o tempo se alongasse como a minha coluna. Quieto e na penumbra.

Ecoa uma turbulência naquele silêncio e tenho a sensação que minhas artérias estão prestes a explodir.

"Eu quero pulsar maior. Eu quero pulsar em RPM. Em beats, bytes, pixels, energia, suor, lágrima".

Cresce uma insanidade no peito de querer dar o salto mais alto, o passo mais largo, o giro mais preciso.

Eu só preciso de três campainhas agora. O sangue corrente chega a ser audível no momento em que ela grita, por três vezes, como eu esperava.

A luz esquenta o proscênio. A cortina revela a caixa aberta em que se encontram as expressões corporais ansiosas por voyeurs. E o ritmo conecta os ouvidos ao ritual que se consumirá nos próximos 50 minutos.

Me levanto, endireito os ombros e me abandono na cadência musical.

8 de julho de 2012

se um dia me perguntassem "Você conhece Jesus"
eu diria simplesmente: Tenho até uma foto com Ele!



serviu.

não sei se vou falar grego agora, mas já houve um alguém, despretensioso, desligado de qualquer conotação carnal, que te disse, no bom e velho português, num diálogo vivo, sem o intermédio da tecnologia: EU TE ADORO, SABIA?

a história é simples.

um domingo longe de ser destaque na memória.
um dia frio tal qual conversa de elevador. 
uma noite destrinchada em desânimo pelo dever-fazer irritante.
um diálogo inconsequentemente trivial acerca do movimento circular de rotação da Terra.

 uma constatação de carinho.

sem "alô" o sorriso vem: largo e sincero como você não achou que iria acontecer até o término desse dia meia boca.
é quando a vida volta a ser boca inteira.
o abraço se fez palavra e repousa no ombro do ouvido pra tardar a sair.
por favor, que sua presença volte sempre.

29 de junho de 2012

(no coração:)
a saudade aqui
é um verso carregado de ventania
que um dia resolveu partir

 nunca mais faltou ar

(no ouvido:)
M83 - I guess I'm floating

15 de junho de 2012

sou um amante declarado do agora.

12 de junho de 2012

Patologia.

Eu tive que procurar um médico.

- Doutor, estou doente. Me ajuda.
- O que você tem?
- Saudade.
 Eu mesmo me diagnostiquei mas não consegui curar.
 Existe um pulsar diferente no meu sangue que suponho ser um pouco mais intenso aqui do que em qualquer outro canto. Sabe aquilo que falam da paixão? Arrebatadora, implacável, sem hora, sem licença... Meu organismo preferiu sentir isso com a tal da saudade.
 Não tenho saudade de pessoas. De maneira alguma... Eu tenho rede social e uns versos pré-cozidos pra colar em murais desavisados.
 Meu problema é com o momento.
 O momento me tira o sossego. Ele me faz querer um chocolate que não fabricam, uma cerveja que não existe, um perfume que não encontraram. É uma vontade de não-sei-o-que que não há telefonema que resolva.
 Tentei me apegar desesperadamente na fotografia. Tentei colocar na imagem o sabor do momento, o cheiro do momento, o sorriso do momento, o extase do momento, a simplicidade do momento... mas não coube. Não encaixa.
Eu não sei o que fazer com o momento. Ele é cigano, não estaciona. Sempre vai. Só vai sem olhar.

 Sou só eu quem olha.

Quisera eu ter tido o livre arbítrio de não conhecer a palavra saudade. Quem sabe assim o sentimento fosse irrisório, sem fundamento, sem noção cognitiva.
Mas eu adoeci de saudade.
eu quis falar de honestidade. quis tacar pedra. quis estapear a cara. quis jogar pra cima e raquetear. quis julgar. quis apontar. quis gritar. até cair.

5 de abril de 2012

Não sei falar bonito pra agradecer.

No caminho tinha uma pedra. Mas havia aquela gente, numa escavadeira improvisada, deixando o chão batido mais fácil de percorrer.

Aquela gente não tem tradução.

Veio fazer sua parte, de graça, e levou na mala minha gratidão.

4 de fevereiro de 2012

Mas cara do que?

To livre.

Tal livro.

Tal larva.

Leve tal vulto.

Tal vela, livro a vista em volta.

Larva de livro livre na lira.

Volto. Visto a veste e vou.

Vida.

"De onde vem a canção"

Oxalá eu tivesse peito pra usar a metalinguagem. Tenho três pés atrás com a palavra.

Não quero falar mal de ninguém, quem dirá pelas costas, mas a palavra é musculosa. Ela subjuga. Não dá tempo pra pensar.

Eu temo a palavra, confesso a fraqueza minha.

Longe de acreditar em teorias da conspiração, não quero impor uma imagem tirânica da palavra.

Mas eu prefiro não tocar na pá. Lavra.

9 de janeiro de 2012

pró.xi.mo

Tive um encontro comigo mesmo, na esquina daquela virada de ano.

Não me reconheci.

Ali, face a face, consegui me descrever como PRÓXIMO.

Próximo aos meus companheiros. Ainda mais próximo, entretanto, aos adornos do meu quarto.

Sou o próximo da fila do banco das realizações. Entretanto, mais
próximo do suor do labor árduo, diário, cotidiano.

Estou próximo de largar tudo e seguir viagem. Mas a proximidade é
maior com a raiz genealógica do meu ser.

Próximo a um colapso existencial, talvez. Mais próximo ainda de um
colapso de gargalhadas.

Próximo, bem próximo da morte. Mas agarrado, bem agarrado à vida.